Advogado ofende a jovem diversas vezes, com consentimento do juiz.
A divulgação da audiência que resultou na absolvição de um empresário acusado de ter estuprado a influenciadora digital, Mariana Ferrer, em Florianópolis, gerou revolta nas redes sociais ontem, em todo o país. Isso porque o site interpect teve acesso e divulgou a gravação da audiência em que o advogado de defesa do acusado profere palavras ofensivas e humilhantes para Mariana.
Inicialmente, o acusado havia sido condenado pelo promotor Alexandre Piazza por estupro de vulnerável, quando a vítima está sob efeitos entorpecentes ou álcool e não é capaz de consentir ou se defender. Ele também solicitou a prisão preventiva do acusado, que foi aceita pela justiça, mas foi derrubada em liminar em segunda instância pela defesa do empresário. A sentença mudou após Piazza deixar o caso para, segundo o Ministério Público, assumir outra promotoria, que mudou o posicionamento e tomou a postura de inocentar o rapaz.
Quem assumiu o processo foi o promotor Thiago Carriço de Oliveira, que classificou o crime como “estupro culposo”. O advogado de defesa do rapaz ofendeu Mariana diversas vezes. “Tu vive disso né Mariana? Esse é teu criadouro né? É teu ganha pão a desgraça dos outros? Manipular essa história de virgem?”, declarou Claudio Gastão.
O caso
O estupro de Mariana teria ocorrido em 2018, em Jurerê Internacional, Florianópolis. Ela conta ter sido dopada e estuprada em um dos camarotes de uma festa. Laudos técnicos comprovam a existência de indícios concretos de que o homem tenha cometido o ato sexual contra a vítima.
Humilhação na audiência
A atuação do advogado na audiência foi amplamente condenada por especialistas na área. até mesmo o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes se declarou contra o modo com que o julgamento foi conduzido.
“As cenas da audiência de Mariana Ferrer são estarrecedoras. O sistema de Justiça deve ser instrumento de acolhimento, jamais de tortura e humilhação. Os órgãos de correção devem apurar a responsabilidade dos agentes envolvidos, inclusive daqueles que se omitiram”, declara Mendes.
O advogado criminalista de Criciúma, com mestrado na Universidade de Coimbra, Franco Cruz Mônego conta que a atitude do advogado de defesa na audiência não representa a profissão, visto que propósito profissional nenhum autoriza um indivíduo a humilhar outro da forma como aconteceu. “Se o debate lhe interessava, que tivesse atuado com a postura que se espera de um advogado respeitado. Lamento que a vítima tenha passado por esta situação, e também que a advocacia criminal, que já detém preconceito popular o suficiente, precise lidar com este gênero de temperamento de seletos colegas”, lamenta .
Sistema seletivo
Embora tenha optado por não emitir opinião a respeito da decisão judicial, Mônego destacou que a sentença, acertada ou não, é um exemplo do sistema penal seletivo que se insere na comunidade brasileira. “Digo isto porque a presunção da inocência e a aplicação do princípio do “in dubio pro reo”, alicerces do direito penal aplicados neste caso concreto, não encontram tanta expressividade nos processos das pessoas desprivilegiadas economicamente e socialmente. Os olhos se iniciam e se encerram com uma culpa presumida, e não com uma justa instrução probatória”, afirma Mônego.
Palavra da vítima
Outro ponto destacado pelo advogado é o fato de o magistrado não ter levado em consideração a palavra da vítima. “A sentença representa este defeituoso tratamento diferenciado na interpretação das provas colhidas, porque sei que, em outros casos, a palavra da vítima poderia ser elemento suficiente para condenação, ainda que o restante do arcabouço probatório apontasse para a existência de uma dúvida, como ocorreu”, diz Mônego.
Estupro culposo?
Embora o promotor tenha classificado o crime como “estupro culposo”, o advogado criminalista explica que a sentença não foi proferida nesse sentido. Isso porque, segundo ele, a decisão se deu pautada no reconhecimento acerca da insuficiência de provas seguras para a condenação.
“Não se citou um novo tipo penal, não se teve uma conclusão dissociada de outros casos concretos do nosso país. A sentença reconheceu a insuficiência de provas seguras, não do ato em si, mas da ciência do acusado acerca da incapacidade de discernimento da vítima. Estupro culposo é uma terminologia infeliz, e muito perigosa para o universo feminino, mas a sentença não versou e nem se utilizou disso”, conclui.
Com informações do site TNSul