Saúde

‘Praticamente perdemos o controle’, afirma especialista sobre avanço da dengue em SC

Santa Catarina já soma 4,7 mil casos de dengue em 2023 e mais de 72% dos municípios registram focos do mosquito transmissor

Divulgação

Os números são alarmantes: desde o início do ano, Santa Catarina já registrou mais de 4,7 mil casos de dengue e mais de 72% dos municípios catarinenses têm focos do mosquito transmissor, o Aedes aegypti, segundo dados da Dive (Direção de Vigilância Epidemiológica).

Os dados demonstram uma tendência de crescimento do número de casos que vem se repetindo ano a ano, especialmente a partir de 2019, quando os casos autóctones – aqueles contraídos no território de residência do paciente – saltaram de apenas 44 registros em 2018 para 1.687, interrompendo uma tendência de queda nos números após 2016, ano em que o Estado registrou o primeiro óbito pela doença na sua história.

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Nos anos seguintes, os números explodiram. Em 2020, Santa Catarina registrou 10.947 casos autóctones. Já em 2021, o Estado passou para 18.624 e atingiu assustadores 80.919 casos no ano passado, um aumento de 434,4% com relação ao ano anterior.

De acordo com o diretor de Vigilância Epidemiológica do Estado, João Augusto Brancher Fuck, a presença do mosquito é o principal fator de risco para a disseminação da doença.

“Se a gente olhar o cenário histórico, em 2013 nós tínhamos três municípios infestados e, ano a ano, a gente vem ampliando este número. Neste momento temos 145 municípios [infestados], praticamente metade do Estado”, explica João Fuck.

Especialista explica possíveis causas para aumento do número de focos

Para entender as razões por trás desta presença cada vez maior do Aedes aegypti nos municípios catarinenses, a reportagem do Portal ND+ conversou com o professor do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia do Centro de Ciências Biológicas da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Carlos José de Carvalho Pinto.

Segundo Carvalho Pinto, o aumento do número de casos está diretamente relacionado à maior presença do mosquito transmissor da dengue. “Aumentou muito o número de focos de mosquitos nas cidades, nós praticamente perdemos o controle disso”, afirma.

Para o professor, três fatores ajudam a explicar a alta disseminação: gestão da saúde, aquecimento global e adaptação do mosquito às condições climáticas de Santa Catarina. Ele aponta que as prefeituras têm feito um trabalho que ele define como “hercúleo” diante da pouca quantidade de pessoas nas ruas atuando no combate ao mosquito da dengue.

“Temos um problema de gestão. Tem que ter investimento, muitas equipes nas ruas, as casas têm que ser visitadas com muita frequência. Para isso, precisa de gente e precisa investimento”, defende. “É importante que o gestor municipal invista nisso, vá atrás de financiamento para prevenção da dengue e combate do mosquito”, completa o professor da UFSC.

As condições climáticas têm contribuído também para uma disseminação mais rápida do mosquito transmissor e para sua evolução à fase adulta, quando começa a transmitir a doença, segundo Carvalho Pinto. “Existe um aumento da temperatura global. Quanto mais calor, mais curto o ciclo de desenvolvimento do mosquito. Com a temperatura em que estamos e as chuvas que enchem os criadouros de água, em uma semana o Aedes já está adulto”, explica.

O professor também sugere uma maior capacidade de adaptação do mosquito às condições climáticas do Estado. “Parece realmente que ele está se adaptando. Há dez anos, o mosquito não passava o inverno em SC. Tinha focos no verão, chegava o inverno e não tinha mais, porque é frio aqui”, comenta.

Doença está apresentando quadros mais graves

Em 2023, o perfil dos infectados pela dengue tem mudado em relação aos anos anteriores, conforme João Fuck. “Há mais casos em crianças e adolescentes, cerca de 30% dos casos, diferente do que se verificava nos anos anteriores, quando adultos jovens, de 20 a 40 anos, eram infectados”, explica. Ainda segundo Fuck, a maior concentração de casos, atualmente, está nas regiões de Florianópolis e de Joinville.

De acordo com o diretor, outra mudança nas características dos casos em Santa Catarina é um maior número de pacientes precisando de hospitalização, o que demonstraria uma maior gravidade dos casos.

A estudante Thaline Oliveira, moradora de Joinville, na região Norte, é uma das milhares de pessoas infectadas no Estado. Ela começou a apresentar sintomas no dia 25 de março, mas acreditou que se tratava de um mal-estar estomacal. “Acordei com um leve enjoo, algo que não me preocupou tanto, mas de madrugada cheguei a ficar com 39 graus de febre”, conta.

Thaline procurou atendimento na rede pública de saúde e, para surpresa dela, já deu entrada como caso suspeito de dengue. “Eu achei que era talvez uma febre estomacal, mas não imaginava que era dengue”, afirma.

Por orientação médica, a estudante estava indo ao Pronto-Atendimento todos os dias para receber medicação e realizar exames de plaqueta. “Na última quinta-feira (30), houve uma diminuição drástica das plaquetas e eles decidiram me internar”, conta Thaline.

Após quatro dias internada e com melhora progressiva do quadro, a jovem recebeu alta nesta segunda-feira (3).

Para o professor Carlos Pinto, a reinfecção de pacientes que já tiveram dengue anteriormente pode ser uma das causas para a existência de casos mais graves da doença. “A dengue possui tipos virais diferentes. Quando as pessoas se infectam pela segunda vez, com um tipo diferente de vírus, ela [dengue] vem muito forte”, explica.

Carvalho Pinto vê com preocupação o avanço acelerado da doença em Santa Catarina, diante do risco de uma sobrecarga do sistema de saúde. “O que eu vislumbro é que se a gente não controlar o mosquito, vamos lotar hospitais com gente passando muito mal com a dengue, coisa que nós vimos exatamente com a Covid-19, e talvez faltem leitos”, alerta.

Em Joinville, a prefeitura decretou situação de emergência no último dia 29 de março. Segundo a prefeitura, dos 1,6 mil casos de dengue registrados no município desde o início do ano, 1,3 mil foram apenas nas últimas três semanas.

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Também no dia 29 de março, o governo do Estado divulgou a liberação de R$ 10 milhões para que os municípios utilizem no combate à dengue em Santa Catarina.

Apesar das ações do poder público, o professor Carlos Pinto reforça a responsabilidade da população no combate ao Aedes aegypti, adotando medidas simples para diminuir os focos.

“São dez minutos por semana que você vai dar uma volta no seu quintal, ver sua caixa d’água, verificar se as calhas estão desimpedidas. Nós temos reponsabilidade nisso, só as medidas governamentais não serão suficientes”, afirma.

Com informações do ND+

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