Decisão judicial pode ser cumprida a qualquer momento. Trezentas famílias serão despejadas.
Desde o mês passado, quando recebeu intimação datada de 13 de dezembro e expedida pela 1ª Vara Cível de Laguna, Rudinete Ilíbio, 50 anos, desempregada, já não tem mais sossego. Moradora há seis anos do Loteamento Juliana, no bairro Mato Alto, em Laguna, foi informada de que teria de deixar a casa em até 30 dias de forma voluntária.
O prazo encerrou na última sexta-feira, Rudinete resiste e agora convive com a angústia de, a qualquer momento, ver oficiais de justiça e policiais militares fazerem o que a intimação classifica como “desocupação de maneira forçada”.
“Não durmo mais, não como direito. Não tenho mais força nem lágrimas para derrubar. A qualquer barulho estou em alerta”, relata. Rudinete comprou um terreno por R$ 17,5 mil e, aos poucos, junto com o marido, Reginaldo dos Passos, 47, também desempregado, foi construindo a casa em madeira. Passos se tornou uma espécie de liderança entre os moradores: quem vive no loteamento ao lado, o Novo Horizonte, também foi intimidado a deixar o terreno. Somadas, são cerca de mil pessoas afetadas pela decisão judicial. “Acabaram com a esperança e o sonho de todo mundo”, lamenta o desempregado.
Enquanto segue pela rua de chão batido, Edu Cirino, 62, recolhe as latas de alumínio que encontra pelo caminho, as quais vende para reforçar a renda. Conta que já investiu R$ 25 mil na casa onde mora com a mulher, pensionista do INSS por causa da cegueira: R$ 15 mil na compra, e o restante, financiado, é aplicado em reforma. “O pobre aqui vive com o resto dos ricos”, diz. Entre os moradores é recorrente o sentimento de incerteza, de não saber para onde ir após o despejo. “Estou sem saída. Aluguel não dá, porque nem serviço tem”, reclama Andrea Demétrio, 39, do lar. Sem rumo também está Geovani Marques, 40, desempregado. Ele chegou ao loteamento há três anos com a esposa e dois filhos, de 14 e 18 anos.
Fátima Pordêncio, 50, afirma que não vai sair de onde mora com o marido e os três filhos com idades entre 8 e 17 anos. Não bastasse a preocupação com o despejo, agora há também o medo de que as casas sejam alvos de incêndios, supostamente criminosos. Na noite de domingo, uma das residências foi destruída pelo fogo, apenas dois dias depois de outro incêndio na vizinhança. Por sorte, os moradores não estavam em casa. Desempregada, Fátima mudou-se para o Loteamento Novo Horizonte dois anos atrás, fugindo do aluguel. Pagou R$ 3 mil no terreno, e como a maioria dos demais moradores só tem acesso à água e luz de forma clandestina: “Quero viver sossegada. Amanhã eles vêm com o trator, e aí nós vamos morar embaixo da ponte?”, questiona.
Reintegração de posse será discutida em um encontro nesta quarta-feira
O terreno em disputa representa uma queda de braço entre os moradores e o governo do Estado. Com 20 hectares, a área pertence à Companhia de Desenvolvimento Industrial de Santa Catarina – Codisc, mas o órgão foi extinto e seu patrimônio, incluindo o terreno em Laguna, passou a ser administrado pela Companhia de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina – Codesc.
De acordo com o assessor jurídico da Codesc, Valdomiro Adalto de Souza, o pedido de liminar de reintegração de posse tramita na justiça desde 2014. Entre os motivos para a ação do Estado está o fato de no terreno existirem poços de captação de água, que correm o risco de poluição com a presença dos moradores.
Souza afirma que não há possibilidade de a ordem de despejo ser revertida. Hoje, ocorre uma reunião em Laguna para decidir como será feita a reintegração de posse. O destino dos moradores, segundo o assessor, também deve entrar em discussão. Mas, mesmo considerado um loteamento ilegal, há quem questione a ação, por possuir contrato de compra e venda registrado em cartório. É o caso de Lauro Gasperi, que pagou R$ 40 mil pela casa e o terreno. Agora, ele estuda processar o antigo dono.
A assessoria do juiz Fabiano Antunes da Silva, responsável pelo caso, afirma que a decisão de despejo está mantida e deve ser cumprida a qualquer momento.
Terreno pertence à Codesc. Segundo a justiça, área foi invadida
A Codesc está vinculada à Secretaria de Estado da Fazenda. Definida como empresa mista, a maioria de suas ações são do Estado. Apenas 0,5% pertence a antigos diretores. Uma de suas funções é fazer a mediação entre o poder público e o setor privado.
Com informações do Jornal Notisul
[soliloquy id=”205085″]