Educação

Mãe volta para a escola e frequenta a mesma turma do filho

Foto: Mayara Cardoso/Clicatribuna

Foto: Mayara Cardoso/Clicatribuna

A realidade da urussanguense Rosana Soares Sangaletti, de 39 anos, moradora da comunidade de Rio Salto, nunca foi fácil. Aos 11 anos, ela precisou largar os estudos para poder ajudar nas despesas da casa. Entre os empregos, trabalhou como faxineira, babá e até na roça. Nenhuma das atividades lhe permitia que continuasse frequentando a escola, apesar de sua afinidade com a sala de aula sempre ter existido. Pouco mais de 18 após deixar os livros e cadernos de lado, eis que uma oportunidade foi oferecida e abraçada com força por Rosana. O dia a dia não deixou de ser difícil, porém, desta vez, ela estava determinada a seguir sua vontade: voltar aos estudos. Foi na Escola Básica Barão do Rio Branco, em Urussanga, que a mãe de família encontrou uma esperança de um futuro melhor. Em 2013, ingressou no 4º ano do Ensino Fundamental e atualmente frequenta as aulas do 7º ano junto com o filho, Paulo José Sangaletti, de 13 anos, e toda a sua turma.

A rotina puxada ainda não foi capaz de vencer a força de vontade de mulher humilde. Às 6h ela já precisa estar de pé, já que pega o ônibus para ir de sua comunidade até a escola, no Centro. Das 7h15min às 11h30min as atenções são completamente voltadas às lições dos professores. Mesmo cansada, Rosana faz questão de ficar atenta a tudo que é dito. Logo após a aula ela e o filho retornam para casa, onde a mãe ainda faz o almoço e se apronta para ir para a segunda e cansativa jornada: o trabalho. Funcionária de uma indústria de plástico e alumínio, a mãe trabalha das 14h às 23h, com pausa de uma hora para o lanche. O tempo de intervalo é precioso e utilizado para fazer os deveres de casa, já que apenas por volta da meia noite ela retornará ao lar. “É difícil lidar com o cansaço. Tenho muito sono durante a aula, pois acabo dormindo pouco. Tento esquecer para aprender bem as matérias”, garante. Além de todos os compromissos, o cuidado com a casa e a atenção para o marido não são esquecidos.

Difícil retorno às salas de aula

A ideia inicial de Rosana era voltar aos estudos frequentando uma turma jovens e adultos. Por não conseguir formar uma turma completa na cidade, ela precisou esperar por dois anos e ainda assim não foram concretizadas as aulas. Por um período, a moradora da comunidade Rio Salto teve aulas no próprio bairro, o que serviria de introdução para sua volta aos estudos. Já sem esperanças de conseguir realizar o desejo, foi na Escola Barão do Rio Brando que Rosana encontrou a esperança. Após uma abordagem inicial a instituição abraçou a causa por considerá-la nobre e aceitou o desafio de ter nas salas de aula a mãe de um aluno. Foi com essa humildade que Rosana precisou encarar o desafio de estudar com crianças, usar o uniforme da escola, fazer provas e obedecer às ordens dos professores.  Para o filho Paulo a ideia também não parecia fácil. Então com dez anos, o menino sentia vergonha de chegar à escola com a mãe, o que fazia com que ela pegasse o segundo ônibus em direção ao Centro. Tudo para que o filho não se sentisse constrangido e pudesse pegar a primeira condução com os colegas. “Era ruim, mas eu entendo. Sei bem como são as crianças. Ele não entendia muito bem”, comenta.

Tímido, hoje Paulo continua receoso para falar sobre o assunto, mas admite que sente muito orgulho da mãe. “Antes tinha vergonha porque não era normal, mas agora já estamos adaptados e é uma situação natural para mim”, afirma.

Colegas têm em sala de aula uma amiga e segunda mãe

Quem pensa que as crianças da turma agiram com preconceito com a nova integrante está muito enganado. Animados com a novidade, os 23 alunos da classe foram, aos poucos, se aproximando de Rosana e se tornaram grandes amigos. Conforme a estudante Gabriela Benedet, de 12 anos, é um prazer ter ganhado a amizade de Rosana. “Não é qualquer um que tem a coragem que ela teve. Eu admiro e acho muito legal”, evidencia. Gabriela é uma das amigas mais próximas de Rosana e sente-se lisonjeada por ter uma colega com quem pode contar. “Quando não entendo algum conteúdo ela me ajuda e quando ela precisa faltar a aula eu empresto meus cadernos para ela recuperar a matéria”, completa.

Para o colega Gabriel Nesi Cittadin, também de 12 anos, é muito bom ter uma pessoa mais velha na turma, pois isso ajuda as professoras a manter o controle da sala. “Espero que ela termine todo o estudo conosco. A Rosana não é só uma aluna e mãe do Paulo. Ela acaba sendo nossa professora e mãe também”, comenta.

Escola e comunidade louvam iniciativa

Não só para a aluna, mas também para os professores a novidade se tornou um desafio. Para a professora de história, Daniela Piacentini Visentin, a mãe se tornou um exemplo para todos da escola. “Ela é pura superação. Um exemplo de luta e força de vontade. Percebeu a importância do ensino para o futuro e está correndo atrás”, cita.

De acordo com a professora, mesmo sendo tratada como uma aluna normal da classe, Rosana impõe respeito entre as crianças da turma. “Como mãe, ela tem instinto de proteção. Quer ajudar, mostrar o que é certo”, garante. Além de ajudar no controle da turma na ausência eventual de algum professor, Rosana é rigorosa no que se refere às notas. “Pelo tempo ficou sem estudar acaba tendo dificuldade em algumas disciplinas, mas ela não se permite tirar nota baixa. É extremamente preocupada e fica chateada se não se sai bem nas atividades”, comenta Daniela.

A diretora da escola, Lisiane Bonettti Fenili, garante que é uma satisfação ter acolhido a nova e especial estudante. “Nós todos da escola abraçamos a causa e nos orgulhamos pela garra da Rosana. Claro que entendemos algumas dificuldades e estamos sempre dispostos a ajudar para que ela não desista. Agora essa causa também é nossa”, afirma.

Em 2014, por indicação da presidente da Câmara de Vereadores da cidade, Daniela Piacentini Visentin, que também é professora da escola, Rosana recebeu o título de Cidadã Honorária de Urussanga pelo exemplo que representa para a sociedade. “Se é um desafio para nós, imagina para ela? A força de vontade e o desejo de ter um futuro melhor fizeram com que ela tivesse a iniciativa e persistisse nessa vontade”, completa.

Expectativa para o futuro

Como será o dia de amanhã Rosana não imagina. Sem deixar de fazer planos, a mãe de família não se dá ao luxo de sonhar alto demais. Para ela, diante da situação, cada dia daqui para frente será mais uma vitória. “Não gosto de pensar como será daqui um ou dois anos para que não acabe me decepcionando, mas quero que seja o melhor possível é, por isso, que estou lutando”, afirma. Realizando o sonho de voltar à escola ela já se sente realizada, mas garante que não pretende se acomodar. “Se já cheguei até aqui, quem duvida que eu possa ir ainda mais longe?”, questiona.

Com informações do Portal Clicatribuna