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Morre aos 110 anos Benito Oliveira, um dos principais líderes indígenas do Norte de SC

Nos últimos dias de vida, Benito viveu na terra indígena Morro Alto, em São Francisco do Sul

Divulgação

Morreu na tarde de terça-feira (1°) Benito Oliveira, aos 110 anos, uma das principais lideranças na comunidade Guarani da região Norte catarinense. Ele passou seus últimos dias de vida na terra indígena Morro Alto, em São Francisco do Sul, e faleceu de causas naturais.

Leonardo Werá Tupã, representante político da aldeia, conta que Benito era um líder espiritual, que foi preparado para ser pajé desde criança. Na função, desempenhava o papel de médico, auxiliando com remédios e consultas para a população; padre, realizando celebrações e casamentos; e até psicólogo, dando conselhos para jovens e adultos.

No decorrer da vida, morou em todas as aldeias da cultura Guarani da região, teve sete filhos e ficou viúvo em 2019. A esposa também faleceu com mais de 100 anos. Na Morro Alto, onde morava atualmente, vivem cerca de 40 famílias, com quatro integrantes cada. Benito foi um líder atuante até suas últimas horas de vida.

— Hoje não só a região Norte, mas a nação Guarani toda está de luto — lamenta Leonardo.

Viveu a cultura Guarani até os últimos dias

Sem falar uma palavra em português — pronunciava apenas Tupi — Benito viveu em sua essência a religião e a cultura Guarani. Reservado, tinha pouco contato com a cidade, exceto quando precisava lutar pelos direitos da população indígena.

Leonardo cita que, na década de 1980, o líder espiritual se deslocou em duas oportunidades a Brasília, onde acontecia a Assembleia Nacional Constituinte de 1987-88, para, junto aos deputados e demais políticos, cobrar um capítulo na nova Constituição que reconhecesse os territórios indígenas.

— Na época, não tinha deputado suficiente pra aprovar o capítulo especial para os índios. Por aqui, o pessoal se agilizou e buscou a parte dos nossos pajés e eles se mobilizaram em todo canto do país, principalmente os Guaranis do Sul e Sudeste, e cada aldeia se organizava à noite com rezas e cerimônias. Isso aconteceu por vários meses seguidos. E o Benito viajou pra lá [Brasília] porque ele achava importante para nossas vidas — lembra Leonardo.

Na ocasião, em seu artigo 231, a Constituição da República Federativa de 1988 reconheceu aos índios o direito originário às terras que tradicionalmente ocupam. No entanto, a luta para permanecerem em seus locais de origem continua até hoje.

— O desejo dele [de Benito] era viver em paz, ter a casa tradicional dele, a casa de reza. Mas aqui na região é complicado, a gente vive em luta da demarcação da terras. Hoje, a questão está judicializada, está parado o processo, e vivemos nesta condição, se é terra indígena ou não para a lei do branco. No nosso entendimento, estamos no nosso território — destaca o líder político.

Bárbara de Jesus, jornalista e antropóloga que tem uma dissertação que trata da territorialidade Guarani na região do Litoral Norte de SC, explica que a terra Morro Alto foi declarada na modalidade Terra Indígena em 2009. Ela conta que os estudos de delimitação iniciaram em 1996, com um longo período de pesquisa, refutação por parte das comunidades e reinício dos estudos de delimitação, que culminou na declaração em 2009.

No entanto, segundo a antropóloga, depois de todo esse tempo de luta, as portarias declaratórias emitidas pelo Ministério da Justiça foram contestadas na Justiça por um conjunto de empresários e políticos da região Norte, que conseguiu derrubar a declaração no TRF4 em Porto Alegre (RS). Portanto, o reconhecimento de Terra Indígena na localidade não foi homologado ainda. A Morro Alto abrange 8,94 km² de terras.

Despedida

Na cultura indígena, como Benito morreu de causas naturais, a despedida acontece na casa de reza, onde o corpo fica em vigília por duas noites. Leonardo Werá Tupã explica que, durante a cerimônia, os presentes cantam, fazem rezas e dizem palavras de conforto ou até sobre o legado do ente que partiu.

Na tarde de quinta-feira (3), Benito será colocado em uma espécie de caixão construído com taquara nativa, que será trançado como um cesto. Depois, o corpo será enterrado.

— Isso é uma forma de respeito. Assim demonstramos que [durante a vida] ele seguiu as tradições e a natureza — diz.

Além disso, é uma maneira de demonstrar que o legado de Benito jamais será esquecido.

— Ele deixou muito claro pra gente ter resistência cultural. Poucas matas tem no Brasil hoje, e isso graças ao índios e o conhecimento dos pajés, dos líderes espirituais. Eu como líder político, aprendi essa essência com eles. Sou um porta-voz, que aprendeu com ele e hoje divulgo para fora esta luta — conclui.

Com informações do NSCTotal

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